quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Youtube transforma relação com a imagem

Coordenador do Pontão de Cultura Digital da Escola de Comunicação da UFRJ, Adriano Belisário, ex-aluno da Escola e ativista a favor de mudanças na lei dos direitos autorais, nos concedeu uma entrevista por ocasião do aniversário de cinco anos do Youtube. Abaixo, Belisário comenta a nova relação com a imagem surgida a partir do site, quais implicações nos direitos autorais essa nova relação traz consigo e comenta algumas diferenças entre bens intelectuais e bens materiais.

P: A ideia da apropriação da imagem mudou com o youtube?

A: Tanto o youtube quanto a proliferação de equipamentos de gravação de vídeo de baixo custo aceleraram vertiginosamente a apropriação da linguagem imagética que já vinha ocorrendo desde o final do século passado. O youtube em específico alterou a distribuição deste conteúdo, modificando o modelo clássico de broadcast para a lógica "on demand"/sob demanda no mundo online. A facilidade de publicar um vídeo no site do google gerou também mudanças estéticas que trouxeram à tona uma produção caseira ou improvisada de imagens, que por vezes é criticada ou ridicularizada, mas que possui um inegável valor sob o ponto de vista da apropriação tecnológica.

P: É possível aplicar os mesmos padrões da propriedade material à propriedade intelectual?

A: Definitivamente não. A propriedade intelectual trata-se na verdade de um monopólio artificial criado pelo Estado que se subordinou aos acordos internacionais desenvolvidos pelos países ditos de primeiro mundo. Ao contrario das coisas tangíveis, o exerc~icio da propriedade privada com os bens intelectuais só pode ser feito artificialmente, pois a própria natureza das criações da mente humana não permite uma apropriação exclusiva. Os bens intelectuais não são escassos: se você me empresta seu carro, você fica sem ele. Se você me conta uma ideia ou uma canção, você não se priva delas.

P: Quando o youtube começou, trechos de filmes, séries, músicas, tudo estava amplamente disponível lá. Depois as gravadoras começaram a retirar sistematicamente material do site. Como essa retirada deve ser encarada? A internet deve seguir padrões mais rígidos nos próximos anos ou é uma medida paliativa que será facilmente burlada?

A: A política de remoção de conteúdo é ineficaz num ambiente como a Internet, que prima pela descentralização da informação. Não é o caso do YouTube, mas recursos online que utilizam tecnologias p2p praticamente inviabilizam a remoção de conteúdos. O google e em menor medida a própria industria do entretenimento ja compreenderam isso e estão buscando novos modos de lidar com esse novo cenário. Desde o ano passado, por exemplo, o youtube trabalha com um sistema de remuneração a alguns usuários que possuem vídeos altamente populares. O autor assim ganha uma pequena quantia toda vez q seu video é assistido, gracas aos anuncios publicitários. É uma medida que ainda não foi adotada em larga escala, mas funciona também já em outros sites como o metacafe.

P: É possível mudar a relação de propriedade com os bens intelectuais sem que haja transformações na relação de propriedade também dos bens físicos? O cenário em que o artista depende de uma remuneração do google ao invés de depender do mercado atual é melhor para o artista?

A: Tem como mudar sim, vide a reforma do direito autoral, que não vai mexer na propriedade da grande mídia. Só mudará a legislação sobre PI e eles estão esperneando pacas. Não vai na propriedade de bens físicos, digo. A diferença é que na internet ou o contato do autor é direto com o público, ou é uma mediação "soft", digamos assim, Como a do Google, que converte as visitas em lucros pro produtor. Aquela mediação hardcore da industria do entretenimento no século passado, quando só existia uma via para se lançar um produto cultural ou algumas vias na mão de poucos é hoje inviável.

Um comentário:

  1. Ótima entrevista,trazendo dados de rápida absorção a respeito da mudança de paradigma do direito autoral intelectual/material. Gol, André.

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