quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Não deixe o samba morrer





O tradicional samba das quinta-feiras da UFRJ, no Campus da Praia Vermelha, encontra entraves por parte da Instituição para continuar existindo

“Samba,
Negro, forte, destemido,
Foi duramente perseguido,
Na esquina, no botequim, no terreiro”
(Nelson Sargento)

É certo que todo bom brasileiro conhece a origem de seu principal gênero musical, o samba. Quando começava a nascer, ele foi fortemente discriminado, sofria preconceitos e chegou até a ser criminalizado. Depois de enfrentar muitos tipos de barreiras, hoje, ele é considerado uma das principais manifestações culturais populares brasileiras, se transformou em símbolo de identidade nacional, se desvencilhando daqueles antigos e absurdos equívocos ao qual era relacionado. Décadas depois, o tradicional samba que acontece às quintas-feiras no Campus da Praia Vermelha, promovido por alunos, vem encontrando entraves e complicações para a sua realização.

Na arte a bravura
Teatro, tropicália e cinema
A independência da cultura
Folia sem repressão (...)

A magia do meu carnaval(Celso Tropical, Rolian Do Cavaco, Pepê, William E Altair)

Em nota oficial, no site da UFRJ, foi colocada a seguinte questão em detrimento das ordens que vem ocorrido para o pedido do fim do samba: Todos reclamaram das festas que estão ocorrendo na rua em frente ao DCE e no Sujinho. O Prefeito informou que a ALMA [Associação de Moradores da Lauro Müller e Adjacências] também formalizou a reclamação e que o assunto é muito mais de fazer todos os esforços para que os alunos entendam que os grandes prejudicados são os alunos que a noite não consegue participar das atividades acadêmicas. É uma situação muito mais de convencimento do que policial ou de medidas disciplinares. Ficou o entendimento que os estudantes serão chamados para que tomem ciência da repercussão”.

Ocorre, porém, que depois que os alunos que promovem o samba tomaram conhecimento da reclamação da Associação dos Moradores da Lauro Müller [Rua próxima ao Sujinho, onde ocorre a Juquinhada], logo entraram em contato, e, após a troca de emails, ficou estabelecido que medidas seriam tomadas para que respeitassem a reclamação dos moradores. Com isso, todo o esquema de som foi repensado de tal forma que os moradores não mais criticam os eventos.

Em relação aos “alunos que a noite não conseguem participar das atividades acadêmicas”, o movimento estudantil que organiza tais eventos culturais passou a realizar o samba no DCE apenas após as 22h, horário em que não mais há aulas, bibliotecas abertas ou atividades acadêmicas. Segundo, um dos organizadores do samba, Luciano Alencar, membro do DCE, os alunos não só não reclamam como são os que mais participam, assim como ex- estudantes que freqüentavam aquele Campus ou muitas vezes alunos de outras faculdades, sobretudo da UNIRIO (que é bem próxima).

Ser sambista é crer, que existe uma solução(Arlindo Cruz)

Por tais razões, a organização que é promovida pelos alunos do Diretório Central dos Estudantes, não concordam que os portões da faculdade fechem para entrada às 22h e reivindicam que estes fiquem abertos entre 22h e 2h às quintas-feiras. Com isso alguns alunos, acabam por pular os portões, por vezes se machucando - como no samba do dia 18/11, quando um freqüentador quebrou o pé ao tentar pular o muro. Por isso quando há um bom diálogo entre a Prefeitura da Universidade e o DCE, o resultado é melhor para todos, uma vez que os organizadores cumprem com as exigências colocadas pela instituição e alunos ficam contentes pelas medidas. Todos saem ganhando. Como foi no caso do dia 3 de dezembro, quando houve uma homenagem ao “Dia Nacional do Samba” (dia 2/12) em que as Pró- Reitoria de Pessoal (PR-4) e a de Planejamento e Desenvolvimento (PR-3) e a Superintendência Geral de Administração e Finanças (SG-6) da UFRJ promoverão um evento especial com grandes shows que ocorreram na Cidade Universitária. Nesse dia, a UFRJ abriu espaço para o DCE cuidar do bar, com isso arrecadarão fundos para o Diretório.

Outro argumento que a instituição usa é a respeito da venda de bebidas alcoólicas, que seria proibida no Campus. A medida ainda foi reiterada no primeiro semestre de 2009, após confusão envolvendo um calouro da faculdade em um evento, em que a bebida ficou como a principal vilã. Além de ser questionável o papel da bebida na história de confusões, o que os alunos pedem para que a diretoria discuta é a liberação do consumo para eventos que promovem a confraternização, sobretudo quando não está em horário de atividades acadêmicas. “Quando é para a cerimônia de lançamento de livro de professores ou posse de decanos, ou nesses tipos de eventos, a bebida é liberada. Por que não poderia ocorrer em um evento como o samba? Ele é um espaço de confraternização de estudantes e manifestação cultural!”, protesta Luciano Alencar, estudante de Economia da UFRJ.

O dinheiro que arrecadam com a venda das “juquinhas” é revertido inteiramente para a melhora do evento, seja para pagar os seguranças, banheiro químico (de forma que alunos não façam xixi no campus, ato que também é reprimido pelos seguranças), trabalhadores da limpeza (pagam a mais para os que ficam no dia do samba), equipamento de som e um cachê decente para a banda. “Não é desorganizado o evento. Há toda uma preocupação com a questão social, como a renda gerada para os trabalhadores que ajudam no samba, a renda gerada para os Centros Acadêmicos, além da confraternização com a galera. Ainda por cima abrimos espaços para os gênios do samba, como Nelson Sargento e Monarco, bem como para jovens músicos, principalmente universitários, exporem seu talento”, coloca Luciano Alencar.

“Velho amigo e companheiro
Alegria dos nossos terreiros
Há muitos anos atrás
É este o mesmo samba verdadeiro”
(Monarco)

A questão de abrir espaço para as novas bandas é de suma importância e não é de hoje. O Teatro de Arena, localizado no Instituto de Economia no Campus da Praia Vermelha, foi palco de grandes eventos artísticos, em que estudantes assistiam a grandes nomes (ou muitas vezes aqueles que ainda seriam os grandes nomes) da cultura brasileira.

Caetano Veloso já cantou para centenas de alunos em manifestação contra a ditadura militar. Foi naquele palco, que João Gilberto lançou seu consagrado LP “Chega de Saudades”, entre outras várias histórias que o local guarda. Esse histórico espaço, há anos não é liberado para alunos realizarem eventos e quando o fazem, ainda que sem permissão, algumas vezes não é bem visto ou é reprimido. “O estranho é que quando foi para lançamento da Revista Versus, usaram o local, ou desfile da marca DASPU, a UFRJ abre espaço, agora quando é algo para os alunos, complicam e muitas vezes não conseguem autorização. O que não pode é um peso e duas medidas”, pondera um estudante.

De forma a contestar pelo direito ao uso do espaço do Teatro de Arena, os estudantes, embora sem autorização, organizaram duas recentes homenagens a grandes nomes da música brasileira realizadas com sucesso. Uma delas a Adoniran Barbosa, em que o grupo “Ih, É Carnaval” - grupo que se originou no IE, Instituto de Economia, da UFRJ e vem crescendo cada vez mais – tocou as principais músicas do autor de “Saudosa Maloca”. Além da apresentação de poemas com Bruno Borja e o grafiteiro Binho desenhou a imagem de Adoniran em uma tela que se encontra no DCE.

Já em de junho de 2010, cinqüenta anos depois de ter sido palco do primeiro festival de Bossa Nova, a "Noite do Amor, do Sorriso e da Flor", o Teatro de Arena recebeu o evento Noel 100 - Homenagem ao centenário de nascimento de Noel Rosa. O evento, organizado pelos Centros Acadêmicos de Economia (CASA), de Comunicação (CAECO) e pelo DCE-UFRJ, foi palco de uma belíssima homenagem onde professores, funcionários, alunos e pessoas de fora da UFRJ se integraram de forma prazerosa por intermédio da cultura. Na ocasião, a banda Zerinho ou Um, formada por estudantes de biologia da UFRJ e de música na UNIRIO, relembrou, em um emocionante show, grandes sucesso desse que foi um dos maiores compositores do cenário brasileiro. “É uma nova geração, resgatando velhos nomes”, coloca Luciano Alencar.

Para a reinauguração do DCE, o samba recebeu Nelson Sargento, Wilson Moreira e o Walter Alfaiate. No final de setembro graças a arrecadações das “juquinhas”, somado a um pouco do dinheiro que o DCE e do Centro Acadêmico de Economia tinham em caixa, foi possivel trazer para o samba a Velha Guarda da Portela. Com grandes sucessos, Monarco mobilizou centenas de estudantes a cantarem músicas do passado, mas que fazem sucesso até os dias atuais. O cantor declarou: “Olha eu gosto de tocar pra quem gosta de me ouvir”, elogiando a participação dos estudantes.


Foi aí que o samba evoluiu
Como representante maior
Da cultura do Brasil
” (Monarco)

É por grandes eventos como esses que os estudantes ainda resistem e lutam pela melhora do samba. O DCE levantou uma petição que consta com quase 200 assinaturas, nomeada com o verso de Nelson Sargento, “Samba, Agoniza, mas não morre”, para sensibilizar a Prefeitura da Universidade a autorizar a abertura dos portões de 22h às 2 às quintas-feiras, os eventos no Teatro de Arena, e na tentativa que estimulem eventos como esses de cultura, confraternização e integração de estudantes (tanto do Campus quanto de outras faculdades), professores e funcionários.

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